Embora considere os pedidos judiciais “um instrumento legítimo” para proteger credores e produtores rurais em situações críticas, o banco avalia que o uso indiscriminado impacta negativamente toda a cadeia agropecuária, comprometendo as margens futuras dos produtores. Por isso, defende ser “essencial que os produtores busquem soluções amigáveis (renegociação, alongamento, reestruturação de dívidas) para manter suas operações e capacidade produtiva”. Assim, em outras palavras, garantiria acesso futuro ao crédito e reduziria impactos sistêmicos.
Conforme noticiou o Campo Grande News, em 21 de agosto, os produtores sul-mato-grossenses iniciaram 2025 no vermelho, carregando dívidas de R$ 1,235 bilhão do último trimestre de 2024. O valor representou aumento de 74,6% em relação ao mesmo período do ano anterior. Somente de janeiro a março deste ano, foram 25 pedidos de recuperação judicial protocolados por produtores rurais do Estado, contra 14 no mesmo período de 2024, conforme informou a Serasa Experian. Os dados foram atribuídos à quebra de safra causada por alterações climáticas e ao ciclo de alta da taxa Selic, o juro básico da economia.
Calote de aventureiros -
O especialista Lucas Dieterich Espindola Brenner, sócio do escritório Brenner & Advogados Associados, especializado no atendimento a produtores rurais e empresas do agronegócio, analisa o cenário com preocupação.
Ele compara o momento atual com o dos últimos dez anos, quando os pedidos judiciais tinham como finalidade garantir o pagamento de credores. Ele alerta para casos de calote. O advogado lembrou que a primeira grande recuperação judicial do agronegócio conduzida pelo escritório foi em 2014, a da família Pinesso, cujo débito era de R$ 1,2 bilhão. A ação foi solicitada por Gilson Pinesso, fundador da Aprosoja e de associações de algodão e de milho, com o objetivo de ganhar “fôlego” para pagar credores.
A partir de 2018, segundo ele, alguns produtores rurais passaram a burlar o instrumento para dar calote. “Desde 2023 percebemos que 90% dos produtores que entram em recuperação judicial é porque querem dar calote, não querem pagar os seus credores. O cenário atual, que é muito diferente do de 2014 a 2018, é super preocupante”, afirmou o advogado, que atende clientes como a Aprosoja e empresas do sistema financeiro ligadas a operações de crédito agrícola, entre elas Panorama, Busatto & Bastos Crédito Agrícola (conhecida como Agrícola Kanadá) e Ferticel, do setor de fertilizantes.
Segundo ele, esses produtores devem para “muita gente”, incluindo bancos públicos, como o Banco do Brasil, e privados, como Bradesco e Santander, principais fomentadores do agro no Centro-Oeste. “Isso ocasiona uma desconfiança enorme no mercado. O ingresso dessa ‘montoeira’ de pedidos de recuperação judicial prejudica a própria classe do produtor rural, dificultando o acesso ao custeio de quem é adimplente.”
Na visão de Brenner, o problema decorre de produtores aventureiros que se aproveitam das leis de Recuperação Judicial e Falência para não quitar dívidas. “A Lei foi criada para reerguer a pessoa com problemas financeiros e, nesse caso, eles utilizam a legislação para não pagar a dívida”, observou.
A estimativa do advogado é que cada pedido de recuperação judicial de produtor rural varie, em média, entre R$ 50 milhões e R$ 100 milhões. Embora reconheça que fatores climáticos possam gerar prejuízos, ele considera que a situação reflete falhas de gestão: “Claro que problemas climáticos podem impactar, mas se o pessoal está com uma gestão bem feita não vai impactar tanto quanto eles dizem que impacta”
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